Mercado
Por que você decidiu falar agora?
A gente chegou a uma situacão
insuportável, e acho que é um momento em que alguém precisa falar algo.
O mercado nosso é podre, podre. Onde já se viu essa competição que
acontece hoje entre duplas, entre escritórios? Nossas carreiras não são
um jogo, ninguém tá competindo, ninguém vai ser campeão no fim do ano se
fizer mais pontos. As pessoas estão equivocadas. Há uma briga de
bastidores hoje entre os escritórios que só atrapalha.
Hoje existem grupos isolados,
escritórios que criam rixas com os outros, e isso não leva ninguém a
nada. Enquanto você se preocupa demais com o que os outros tão fazendo,
você tá deixando de se preocupar com seu trabalho. Eu tô com nojo,
disso. Nojo.
O seu escritório também é bastante criticado…
Sem dúvida, e eu incluo o meu nisso.
Os escritórios viraram ilhas e os artistas se fecharam em grupinhos. Tá
todo mundo esquecendo que nós não somos nada, somos apenas cantores
tentando fazer o que a gente mais gosta. A vaidade tá acabando com
qualquer coisa boa que ainda restava nesse meio nosso. Se a nossa
preocupação principal não for a música, a carreira tá com os dias
contados.
Houve alguma passagem específica que te incomodou mais?
É muita coisa, não são
acontecimentos isolados. Eu fico puto, por exemplo, com essa cultura do
tapinha nas costas. Você recebe a pessoa numa boa no seu camarim, na
maior boa vontade, e fica sabendo que ela vive tentando descobrir quanto
foi seu último cachê, seu último público, como anda sua carreira… com
qual intenção? Onde a pessoa acha que vai chegar com esse comportamento?
Não é um comportamento comum a qualquer mercado?
É diferente. Diferente porque aqui
não há concorrência. Uma dupla ganhar menos não quer dizer que eu vou
ganhar mais. Uma dupla sumir, não quer dizer que outra vai aparecer.
Isso não competição. Não muda nada se fulano ganha mais ou menos que eu.
Você me entende? Nós temos mais de 6 mil municípios no Brasil. Tem
dupla pra cobrir tudo isso? Não tem, essa visão de concorrência dentro
do próprio mercado é o fim. Olha o que eu tenho, olha minha casa, minha
vida… você acha que eu tenho que me preocupar se tem um cara ganhando um
cachê mais alto que eu? Eu tô errado?
E quem alimenta, quem cria essas intrigas?
São coisas de bastidores. Há uma
competição insana entre empresários. Eu não preciso citar nomes pra que
as pessoas saibam, todo mundo no meio sabe o que acontece, mas isso
precisa acabar. Isso tá estragando a vida de quem tá ali pra trabalhar,
de quem vive de música. Me diz, cara, como é que uma pessoa trabalha a
semana inteira, às vezes tem um dia só de folga, e consegue perder tempo
pensando numa forma de derrubar uma outra dupla? Qual o benefício em
ver um evento dar errado? Em geral, as pessoas precisam baixar um pouco a
bola e pensar mais na própria carreira.
Critica-se muito os anos 1990, falam
que os “Amigos” fechavam o mercado, que só três duplas cuidavam sozinha
do mercdo, mas o que se faz hoje é muito pior. É ridículo.
Não é um pouco de romantismo da sua parte achar que um mercado tão grande não vai se comportar como qualquer mercado?
Não, não. Minha visão é realista e
atual. Eu vivo isso, eu sei o que eu tô falando. Hoje nós temos 20
grandes contratantes no Brasil, e eles tem aquele menu não muito extenso
de artistas que vão fazer as festas mais importantes do país. E tem
cara que não sabe aproveitar, agradecer por fazer parte desse grupo
seleto, sendo que a gente tem milhões de artistas querendo esses
lugares. Cara não aproveita, prefere ficar gastando tempo bolando uma
forma de te derrubar.
Toda a situação que você descreveu já te fez pensar em parar em algum momento?
Sim, várias vezes. Já pensei em
parar, sumir, ir pra roça e ficar lá. Eu não trabalho pra viver isso, eu
não sou obrigado a passar por isso, viver essas situações. O que nos
mantém é que há sim relações de amizade muito firmes, pessoas que você
quer muito bem e você sabe que é recíproco. Mas no geral, fazemos parte
de um meio muito podre.
___
Música
A nova linha do mercado sertanejo, que trata música mais como negócio do que como arte, já tem seus resultados negativos?
Sem dúvida. É visível pra todo
mundo. Hoje você compra tudo, as pessoas aprenderam isso. Paga o jabá na
rádio, compra a matéria, aparece na TV, então qualquer coisa é capaz de
aparecer, por isso muita coisa ruim consegue espaço. Mas aparecer e
fazer sucesso são coisas diferentes. Você pode estourar uma música ruim,
ganhar uns trocados, comprar um carro bom, mas em menos de um ano você
já tá de volta à estaca zero por não haver base. Não adianta querer
explicar o que é uma carreira de sucesso pra alguém que tá feito louco
atrás de um hit.
Eu tô ficando meio grilado com esse
lance de história musical. Eu não posso falar de carreira porque eu
tenho 7 anos, mas eu posso falar de base, de conhecimento. Hoje tem
artista que não conhece de música, não vive música, não tem noção de
nada, acha que ser músico é uma profissão que você escolhe da noite pro
dia pra ganhar dinheiro.
E isso ilude muita gente, não?
Exatamente, estamos criando uma
geração de artistas iludidos. Música é mais dom do que meio de vida, não
adianta o cara pensar de repente música pode ser um trabalho como
qualquer outro. Eu participo de festival de música desde os 8 anos de
idade, e mesmo assim eu não pensava que música seria minha profissão.
Essa ideia de artista como negócio, como lançamento de um produto
qualquer, sem nenhuma verdade e espontaneidade, só faz criar iludidos
que somem na mesma velocidade que aparecem.
E o futuro é ruim, como muito se fala dentro do próprio meio?
De forma alguma. Isso que tá
acontecendo musicalmente é passageiro. Vai estourar um aqui, outra ali,
mas a música sertaneja não cai, não some. O romantismo vai acabar
voltando a ter mais destaque, nos shows a gente percebe a reação quando
você canta uma música nova romântica.
Se um cantor novo, com investidor poderoso, te pedisse uma dica do que fazer pra começar, o que você diria?
Sinceramente, eu mandava ele
esperar. Calma, deixa essa loucura passar, ela vai passar. Com a música
sertaneja, com a música romântica, ninguém acaba. Vai devagar, pensa
numa carreira, pensa em repertório, em um trabalho concreto, e deixa a
poeira baixar um pouco.
As pessoas se esqueceram
completamente que quem escolhe o sucesso é o público. Não é o
empresário, o cantor, o escritório ou o dinheiro. É o público. Você pode
fazer barulho, reclamar, xingar, gastar dinheiro, mas se as pessoas não
gostarem, você não é ninguém, a música não é nada. Você pode ter 5
milhões pra investir e gastar esses 5 milhões sem ter nenhum retorno.
Você já viu um show do Amado
Batista? Já foi em um show do Leonardo? Aquilo é a resposta: povo. O
sucesso quem escolhe é o povo, é a massa, é o lance da identificação, e
isso parece ter sido completamente esquecido. É por isso que no meio
você ouve falar de um monte de “sucesso”, mas quando chega na vida real,
vê que é tudo mentira. Isso aqui é vida real
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